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A mostrar mensagens de 2012
Quando é que se libertam Os presos da consciência, Os pregos na inteligência, Os peçonhentos bichos Que me roem por dentro? Sou roído gradualmente Parece que planearam, Uniram-se e atacaram, Cresceram devagar e fluíram Pelo meu sangue e mente.
Entro na sala do café E o fumo espiralado lambe-me a solidão, Ela desaparece e perguntam por mim, Querem saber de mim! Respondo sempre bem E que está sempre tudo bem, Que o dinheiro vai e vem E que tenho saúde de ferro. De quando em vez dizem Que tenho ar apático e aéreo, Até me perguntam “o que se passa?” Só me ocorre que o tempo não passa. Só não me vejo correr Atrás do que me sinto querer, Só o que não quero é que galopa para mim Só estou só, e não vejo o fim.
Somos felizes por reacção Química, explosiva e nuclear, Atómica, voraz e lunar. Em jeito de resumo, por um erro. Se sou feliz é porque me engano, Me enganei ou me enganaram. Foi um equivoco que os espelhos nos criaram, Porque o erro é o núcleo da felicidade. Se vais a correr tropeça, Hás-de te afogar até aprenderes a nadar Grita até te doer a falta de ar, As estrelas estão desalinhadas por alguma razão E por mero acaso Quando o nevoeiro se deita Não passa a vida que é perfeita, Não passa o erro, cobarde e ferido.
Ter como mapa Imagens rudes e rascunhos Torna difícil o caminho, Adiar é sempre mais fácil.           (e por adiar definho) Respirar é assustador Quando o ar é perfume De mofo e papel a arder, Estufa-se o sentir e a consciência.         (e no espelho vejo-me a tremer) Cruzo-me com sombras e reflexos E não me reconheço em nenhum Porque nada reflecte a explosão, Cada pensamento é dinamite.         (e morro novo de indecisão)
As razões para o que faço estão marcadas em risquinhos que me enfeitam a alma, aos quais chamam cicatrizes. Também não sei como é que abriram nem como fecharam, por isso não vale a pena perguntares-te porquê. Se calhar muitas delas nunca chegaram a abrir; está tudo na minha cabeça, explica-lo exigiria muitas horas queimadas, muito cigarro digestivo e todo um reboliço que nem a um poste de luz interessa. Imagine-se que toda a gente tinha uma tal cicatriz na língua. “tão man, como é que fizeste isso?”, perguntaria eu a cada pessoa que passasse por mim. “pá, lambi uma faca” e eu perguntava logo “epa mas tu és estupido ou que???doeu muito???” “ya, as dores foram horríveis, mas a parte boa, quando é boa, é meeeeeeesmo mesmo boa” E pronto, lá lambi a faca e, sem chegar à parte boa esvaí-me em sangue e juízo, tudo directamente para a massa pastosa do esgoto. Fiquei um bocado danificado, visto que morri. Mas ao menos ao morrer senti aquela dorzinha que as pessoas diziam que sentiam qua...
Mar fulgurante, não se vê Aonde tocas o céu, és intransigente. Rindo, remo em ti, e rapidamente, Inebriado, Adormeço a chorar um fado. Mar ilusório e celestial, A bom porto não me levas, eu sei, Rastejo para terras sem lei. Gritar não me vale de muito, Alheou-se-me o fortuito Rareia-se-me o ar. Isto de ser velejador, De velejar pr’álem do torpor… Ao menos no mar-alto posso cantar. Trinta mil vezes A sonhar já te atravessei. Para mal da minha alma Acordei. De olhar em volta, iludido As lagrimas caiam-me dos olhos, Sem nunca te ter, tinha-te perdido. Chorar sei que de nada me há-de valer Ainda que me limpe a alma de dor. Rosto ensopado por amor, Dentro tem a alma a arder. O tempo já não o vejo a correr, Se velejar for sempre assim O mar vai-se afogar em mim
Sem pegar fogo Esfumo-me por dentro, A alma entra em lenta combustão, Tenho cinzas no coração. No lugar da chama Tenho uma furna em mim, Das minhas feridas sai poeira, Uma dor que não é verdadeira. Boto álcool na labareda Quero a alma a arder, A chuva esbate e escorre, E vida sem calor morre. As cinzas no coração Já não voltam a incandescer, São pó que leva o vento, E o espírito rasteja, lento.
Querer ser alguém, Querer ser de alguém, Querer fazer bem, Querer fazer o bem. Nunca somos nada Nunca somos de ninguém Ter ilusões é o princípio da estrada Que não está iluminada. Afinal de contas, somos quem? Querer é poder tentar, Mas há também que querer tentar, Sem querer queremos demasiado, Tentamos passar ao lado E deixamos de querer poder tentar. Remorsos, ressacas, ressentimentos Quando nos apercebemos Que no ponto mais alto do ser Falhámos na vida os momentos.
Ser um só, é possível?! Somos inevitavelmente multifacetados?! Somos um decorrer de estrada, mudamos cada vez que vemos uma curva e a estrada da vida é infinita em sinuosidades. Tomamos consciência disso e acabamos por ser uma multidão colorida, corrompida e indefinida. Azuis em dias mudos, egoístas em anos atrozes e desfocados a vida inteira.
Torpe zumbindo. Não se ouvem as folhas a dançar Nem o correr fluido Da chuva a cair e a embalar Os bebés e os ressequidos Que de noite vagueiam na sua cela Sussurram e ressonam cansados Depois da euforia. Perseguir movimentos E ter o olhar da gente, No coração puros rebentos Quem é assim não mente. Quem é assim não joga mesquinho Na sociedade nem no berço, Vagueiam na cela da vida Uns no fim outros no começo.
Sendo incerto, Cheguei perto De lugar nenhum. Em sítios errados, Sonhos foram apedrejados Não sobrou nem um. Não agarrei nem consegui, Queria tanto mas estremeci Adormeci na vala comum. A vertigem era grande, E o ar cortante Tresandava medo. Nunca mais sonho, O real é medonho O real é degredo. A cirrose saiu a ganhar, Não de álcool mas de amar Tardiamente morri cedo.
Larguei os últimos suspiros Assim que a tua voz, Rasgou cristais e espuma. Mergulhei, estamos sós, Eu, tu, água e bruma. Com sede d'eternidade, bebi o oceano. Escondes-te na concha Menos timida do mar, Que beija o Sol durante o dia E se deita com o quarto lunar. Sem saber que perdia, Desafoguei o abraço à vida. E assim me levaste pra tua casa. Não fizeste café, Não nos saboreámos. Assentei em ti a minha fé Ingénua, e girámos, Como o casal duma viúva. Sufoquei, há mais água Em mim que vida. Morria e afogava feliz. Nadas à minha volta, fluída E eu adormeço como sempre quiz. Com a tua canção na cabeça.
Doem-me as costas, Estou com o pé dormente E escarro sangue e pó. Queixo-me Para que alguém oiça Vire a cara e diga: Está tudo bem, Amanhã vai ser melhor. Mas não é. Todos nós, encavacados. Os burros são roubados Os espertos são furtados. E eu deito-me na calçada Respiro os seus calhaus, Do chão já não passo. Ao menos o chão do Paço Até é relativamente limpinho. Mas não é O chão lá não vê sonhos Nem poemas Nem coisa nenhuma. Lá o chão vê sebo, Poças duvidosas e asquerosas E poetas deitados, Roubados e amarrados Ofegantes e queixosos, Como eu.
Duvidemos da cor da iris De cada um de nós, Somos piores que camaleões. Rezemos a Osíris Até ficar sem voz, Derrubaremos portões. Estalemos o verniz Bebamos o ácido atroz, Que não vem de limões. É apenas bílis Que acalma esta sede feroz, Mas não a cirrose de paixões. Limparemos a merda que fiz Pois já não há eu, somos nós, Somos rebanho, ocos que nem melões
Zarpar Perder de vista a cela Não reter o pensamento Renegar. Zarpava Tirava os meus sonhos da tela Sem hesitar um momento Renegava. Zarparia Se conseguisse apagar a vela Que apaga-la não consegue o vento Renegaria. Zarparei Assim que aprender a fala Dos que tendo tecto dormem ao relento Renegarei. Zarpo Choro por esta terra, não vou mais pisá-la Não me contenho, também não tento Renego. Zarpei O meu espírito entrou na caravela Que me há-de levar à esperança e ao tormento Reneguei.
Sórdida, mas sempre altiva Marca-me com ferro em brasa. Corta-se ás fatias Quando lhe apetece. Queria marcá-la também Para ver se está viva. Gostava de apagar uma beata Naquele corpo pálido. Nunca chego lá Nem que salte até mais não. Fico à espera, na treva E vejo-a partir vestida de prata. Exilaram-na lá no alto Para mandar calar os grilos. Acabaram enfeitiçados Os pobres bichos. Agora não param de cantar, tresloucados Ao céu cor-de-asfalto. Não pensas no que estás a fazer Quando apareces, incandescente. Tiras o encanto a Vénus E roubas o escuro à noite. Sou um grilo sem voz, Só me deito ao amanhecer
Arde ardiloso Em languidas labaredas, Fugazmente fogoso, O tronco trépido Num transe trémulo. Puxando pungentemente Grito eu, grotesco, Ao Sol que me queima, À chuva que me apaga E ao sal que se esfrega nas minhas feridas Ao fim de puxar, polido e brilhante, Engulo tudo de uma vez: O Sol A chuva E o sal. Engulo peixes sem cuspir espinhas, Sinto-os a nadar cá dentro. Estou inchado, enorme Já nenhum mundo cabe em mim. Estou sem Fado, disforme Já acabei, mas não cheguei ao fim.
o chuvisco, arisco, não serve de isco a um pisco que passa a vida sem correr um risco. e o Sol corre à caracol de casca mole, e rende carcanhol a uma mulherzinha perdida c'o vende ao pé do farol sadia, vende maresia. apregoa o Sol de cada dia , que dá calor e alumia "olha a geada, ainda agora caída" grita, viva, a velha maria