Já olharam bem para as estrelas hoje? Pois é, não têm nada de especial, estão assim todos os dias. E quando não estão assim, é porque têm o veludozinho húmido das nuvens a escondê-las. Por vezes brilham muito mais do que hoje, resplandecem que nem faróis cravados no tecto do mundo. Adoro ter nas estrelas uma companhia no escuro da solidão, são persistentes e quase nunca fogem. Às vezes quem foge somos nós que, afocinhados no chão de terra sonolenta, na Terra que circula lenta, perdemos o hábito de olhar para cima, e o essencial de olhar para cima é perceber a nossa gigantesca pequenez. Perder-mo-nos no nosso umbigo, contornando-o como a uma rotunda, infinitamente, acontece demasiado. Mas se pelo menos uma vez por outra tivermos a audácia de olhar o céu e sentirmo-nos pequenos, é possível que não sejamos engolidos pelo redemoinho de egocentrismo que temos no centro da barriga.
Afinal eram camélias
Vejo-as todos os dias Da almofada que me sequestra, A espreitar da minha janela E a roçar as grades ferrugentas Da jaula platinada que guarda os meus medos. Elas não me perdoam a inércia E choram castanho e bafio Cospem pétalas cansadas E não renovam os seus botões, Por despeito. Oiço rir e imagino as tuas amêndoas Rasgadas em luz negra aveludada, Apertadas contra a chiadeira do meu peito. Descolo as pálpebras que teimam em selar Os meus olhos, para a ilusão continuar, E vejo que quem ri é a roseira. Pensei em fazer um arranjinho Que te mostrasse onde os meus lábios Querem ir, e dissesse os poemas Que eu não sei escrever. E quando me fosse embora A rastejar de volta à gaiola do meu penar, Ias lembrar-te da nossa ardência Cada vez que te cheirasse a rosas. Mas elas escolheram desviver, Como eu tentei fazer com os meus sentimentos. Não fui capaz, E eles ainda me beliscam os mamilos Do lado de dentro. Entretanto as cameleiras, Com os seus brotos de alvura virgem Vão regenerando e pe...
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