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  Foi uma fonte Comicamente humana Com berloques e franjas engalanadas Pressão presa com arames e cuspo. Traços de corrente Assente numa estría Quente e fria Engorda e esmifra Sempre morfando e rasgando peles Que nascem por dentro iguais às de fora. Sempre fonte, nunca rio Sem rápidos nem compassos Um circuito fechado com filtro aberto. Glândula pineal marmorizada Com leões que vomitam laivos de chama Sem combustível. Era uma fonte Que unia gente à volta Numa praceta com palmeiras e chorões Salgueiros que não salgam E balsas e amoras silvestres Maduras de amor sem foco. As placas indicam Que me perdi Nos oceanos de ternura Cristalinos irradiando negrume. As pessoas passeiam os seus traumas Tipo cães atrelados a um autocarro urbano E sorriem perto da fonte Que não sorri de volta. Os leões sem expressão asseguram a calma No rebuliço da urbe em trânsito. A fonte chora continuamente Para que riam os cantores e bêbados Que nela matam ressaca, sono e sede. Continuou a ser uma fonte Aceitou o

Parqeu

  Os plátanos da alameda, Que me cruza o lombo E atravessa a espalda de alguém por conhecer, Despem-se de significado como o passado E soltam questões alergenicas. A cidade respira mal e satura-se em rosas murchas Vê-se desfolhar em prantos sépia cinza E as ruas que percorro de olhos remelosos Devolvem relances vesgos. Olho para o chão em defesa Procuro a minha dignidade entre as pedras da calçada. Fui assombrar o centro da metrópole Sempre a espreitar os ralos e bocas de incêndio. A alegria que deixei algures no verão Não brilha nem sorri de volta Tem pestanas irrequietas Que colam e encrustam quando os plátanos se começam a desnudar Paro mais uma vez À costa da minha assombração Que não vai chegar a ter um destino. Respiram as tampas de esgoto Sinto-lhes a pulsação dentro do meu ouvido. Havia uma canção que iluminava as catacumbas deste porto E a sua poesia melódica trazia-me de volta a mim. Cansei os barcos e casei os anos As docas em cima de areia Parecem cemitérios em arraial. A c
  Estávamos num barco Embalados pelo vaivém da lua Peles molhadas no convés à deríva Consumidos pelo breu, alumiados só Pelo incandescer das nossas almas E de repente, é um ar mais frio que passa Arrepiando o átrio da tua alma. Olhámos a bombordo sem ter noção Que de bom este barco já só tem uma canção E talvez mais duas ou três frases.  Agora eu tento escrevê-las emparelhadas, Ou empinadas, encruzilhadas, enlatadas.  De uma forma qualquer que te dê a impressão que tenho substrato.  Sento-me no convés e acho que não te mereço  Entretanto o barco treme E tu fechas-te em copas Estou à tua frente e não me focas Eu não queria ser corta mocas Mas tenho reparado que só bezana é que me tocas E eu fico a pensar que tens nojo de mim E que sou um erro de casting.  Consegui que alguém me comprasse e agora quero que me devolvam.  Eramos dois em espaço de um Eu espremia-me cada vez mais perto E tanto quis ficar alí a boiar Que adormeci e acordei num deserto

MMTC

  Mar fulgurante, não se vê Aonde tocas o céu, és intransigente. Rindo, remo em ti, e rapidamente, Inebriado, Adormeço a chorar um fado.   Mar ilusório e celestial, A bom porto não me levas, eu sei, Rastejo para terras sem lei. Gritar não me vale de muito, Alheou-se-me o fortuito Rareia-se-me o ar. Isto de ser velejador, De velejar pr’álem do torpor… Ao menos no mar-alto posso cantar.   Trinta mil vezes A sonhar já te atravessei. Para mal da minha alma Acordei. De olhar em volta, iludido As lagrimas caiam-me dos olhos, Sem nunca te ter, tinha-te perdido.   Chorar sei que de nada me há-de valer Ainda que me limpe a alma de dor. Rosto ensopado por amor, Dentro tem a alma a arder. O tempo já não o vejo a correr, Se velejar for sempre assim O mar vai-se afogar em mim
sacrifico a minha alma aos deuses da apatía Eles cospem-na de volta e contemplam-me: Sabem que eu não lhes devo nada. -Tu não estás apático Dizem-me em palavras calmas com o zumbir estático, firme e calmo do Universo Eu pensava que esta minha letargia se apelidava apatía, sentia-me no direito de a partilhar com as entidades que são o Todo e o não-Todo. Mas descobri, por vía desta negação dos que Tudo-Nada são, que o poder de apatizar a alma não pertence ao domínio humano. A apatía rejeita o sentir e eu, enquanto alminha espantada, petulante e propulsionadora de movimento, deslizo em cristas de espuma salgada cristalina de sentimento, ondas do meu fulgor ridiculamente dramático. Logo, como Eles me disseram, não estou apático. Apático está o carvalho centenário que come das mesmas raízes o mesmo chão que comeu há incontáveis gerações de pessoazinhas atrás. Assim como o Siddartha incólume que, silente, proclama o ohmmm, eterno criador e destruidor de tudo o que conhecemos e é
Esta morte do ser que é ter medo de ser, de não ser, ser demais ou a menos. Este definhar da alma que não agita nem morre, não adiciona nem dissolve. Este correr sem estrada, descalço sem chão para pisar ou preso sem trela para desafogar. Abrasam-me chamas neutras da cor da cal e sinto mármore no tórax, tão pouco rosa quanto a minha indolência. Nem o fumo que faço é denso, apesar dos meus pulmões chiarem como um comboio a vapor. O meu coração palpita por pena do resto dos órgãos e as terminações nervosas do meu cérebro jogam ao peixinho sentadas em cadeiras frágeis do caruncho. A bicheza apodera-se de mim. A bicheza sou eu. Olho para a televisão desligada e vejo um filme de memórias imaginadas. E que romântico... As minhas memórias são putas solitárias e prostituem-se baratinhas. Dão tudo o que têm num acto de amor lânguido e fogosamente abnegado em troca de cinco paus de atenção e meio cafuné.
Monstro repelente Castanho e de suas jubas dono. Bela de olhos aveludados, Também Bela mas sem sono. Vistos uma e outra vez Num sofá velho e roído. Ah, quantas vezes revistos... De fim feliz e meio sofrido. Escafandro imóvel Baba-se por todo o lado. Paira à sua volta reluzente Um bicho psicadélico alado. O cepo continua sem se mexer, Borbulha em si um cometa. Arde todo por dentro E incendeia a borboleta India semi-nua Que faz erguer a masculinidade De um colono aloirado... Outro amor sem possibilidade. Se eu quisesse por acaso Descrever todos os amores que me passaram pelos olhos Não dormia hoje nem amanhã E dos meus dedos restariam folhos Já vi incriminar um homem Por deflagrar uma mulher sem intenção de a amar Ainda não foi sentenciada a pena E por aí continua ele a vitimar. Julgo pois, do meu confortável assento Posicionado de frente para estes crimes Que o pior deles todos é o meu, Pois tudo o que sei de a